No final da tarde desta quinta-feira (1), cerca de 500 indígenas do povo Kinikinaua foram duramente reprimidos pela polícia militar, enquanto tentavam retomar parte do seu território das mãos de grileiros, em Taunay, distrito do município de Aquiduana, no Mato Grosso do Sul. Não houve nenhuma tentativa de diálogo por parte da PM. A operação de remoção, realizada sem ordem judicial, contou com a participação de pelo menos 130 agentes de três batalhões (Choque, Tático e Operações Especiais) e com o uso de um helicóptero.
Segundo relato dos indígenas presentes, não houve nenhuma tentativa de diálogo por parte da PM, que já chegou atirando e despejando gás de pimenta. Imagens veiculadas pela página Respeito Etnia Terena mostram um indígena alvejado na cabeça por uma bala de borracha e crianças da comunidade tradicional chorando, assustadas com a violência. Uma gestante também foi ferida.
Os indígenas contam que a conversa com o gerente da Fazenda Água Branca, incidente sobre a terra reivindicada pelos Kinikaua, assim como a saída dele e dos demais trabalhadores rurais do local, foram pacíficas. “Nós demos uma hora para ele sair e voltar depois para buscar o restante das coisas”, explicou Diele Kinikinaua à imprensa. Durante a tarde, no entanto, a Polícia Militar do Mato Grosso Sul chegou ao local, atacando de surpresa.
“Nós, mais jovens, fomos para o portão da fazenda ver a chegada das viaturas e ônibus de policiais, e eles chegaram por trás da propriedade, e pegaram de surpresa os idosos e crianças. Tinha criança chorando, perdida da mãe. Foi horrível”, diz Diele.
Segundo ela, os Kinikinaua tentaram conversar com os policiais, mas não houve diálogo. “Eles chegaram atirando balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo. Uma liderança (Manuel Kinikinaua) teve um ferimento na cabeça e uma gestante ficou ferida na perna.”
Ativistas denunciam que a ação teria contado com o apoio direto do atual prefeito de Aquidauana Odilon Ribeiro, latifundiário da região e primo da atual ministra da agricultura Tereza Cristina. Em um áudio atribuído a Odilon, que circula em grupos de apoio ao movimento indígena, o homem afirma que a ordem de retirada dos indígenas da fazenda teria vindo de Brasília, e que a orientação é que os policiais os retire “ou por bem ou por mal”.
“Já me pediram aqui dois ônibus pra levar 90 policiais militares, e já tem uns 40 lá, então vão tirar ou por bem ou à força”, informa.
Obrigados por muito tempo pelo órgão indigenista nacional a renunciar sua identidade, os Kinikinaua foram expulsos de suas terras há pelo menos 100 anos, quando o governo da época adotou uma política de confinamento dos povos originários a partir da criação de reservas. Sem nenhum território próprio oficialmente reconhecido, vivem atualmente espalhados por aldeias de outras etnias, na porção ocidental do Estado de Mato Grosso do Sul.
A maior concentração do grupo habita a aldeia São João, ao sudeste da Reserva Indígena (RI) Kadiwéu, município de Porto Murtinho. Há também notícias de membros residindo em aldeias Terena, em Aquidauana (Bananal e Limão Verde), Miranda (Cachoeirinha e Lalima) e Nioaque (Água Branca e Brejão).
Reivindicado pelos Kininikaua há muitos anos, o local do conflito encontra-se atualmente sob posse da Fundação Bradesco, que a adquiriu de grileiros ligados ao agronegócio da região.
Nas redes sociais, lideranças indígenas estão se mobilizando em favor do movimento desse povo pela reconquista dos seus direitos territoriais. Professores, antropólogos, familiares e funcionários públicos indígenas estão sendo chamdos para se solidarizarem com a causa.
“Convido todos os guerreiros de luta, para que a gente possa mostrar aos ruralistas que o nosso povo tem direito! Se o Governo não o fizer, faremos nem que seja a preço do nosso sangue”, pontua um dos manifestantes no áudio.