Polícia Militar promove chacina no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo

Moradores afirmam que foi uma chacina: "Os corpos estão todos jogados no mangue, com sinais de tortura", relata um morador da favela.

Os corpos de pelo menos dez pessoas foram resgatados por moradores e familiares — Foto: Reprodução

Moradores do Conjunto de Favelas do Salgueiro, em São Gonçalo, na Região Metropolitana, retiraram dez corpos de um manguezal na localidade da Palmeira, na manhã desta segunda-feira (22). Os corpos começaram a ser resgatados na noite de domingo (21).

A chacina aconteceu no dia seguinte ao Dia da Consciência Negra.

Os próprios moradores afirmam que foi uma chacina: “Os corpos estão todos jogados no mangue, com sinais de tortura. As pessoas, uma jogada por cima da outra. Estava com sinal totalmente de chacina mesmo”, relatou um morador que não quis se identificar.

A assumiu a operação, e disse que “encontrou com um grupo de traficantes na mata”. A operação e as mortes não foram comunicadas à Delegacia de Homicídios, o que fez com que a Polícia Civil só chegasse ao local 15 horas após as mortes. A ação seria uma retaliação a morte de um policial militar, o sargento Leandro Rumbelsperger da Silva, atingido na na sexta-feira.

Essas ações são conhecidas como “operação vingança”.

Assim que integrantes das instituições de chegaram na favela, na manhã desta segunda-feira (22), encontraram uma pilha de roupas pegando fogo. Segundo moradores, elas pertenciam as vítimas e foram os policiais que atearam fogo – com o objetivo de apagar provas periciais, crime que representa fraude processual.

Moradores denunciam que agentes queimaram roupas das vítimas para apagar provas periciais — Foto: Reprodução

Segundo relatos, policiais entraram atirando e o número de mortes pode ser maior. Outras 15 pessoas estariam desaparecidas, o que elevaria a um número próximo ao da chacina do Jacarezinho, neste ano, com 28 mortes.

“Falaram: ‘é morador, é morador!’. E eles: ‘morador também morre’.”

Moradora em entrevista a jornalistas.

Ao jornal Extra, um morador denunciou: ‘Resgatamos os corpos e não achamos nenhuma arma. Fizeram uma chacina’. A execução, que teria também sinais de tortura, atingiu traficantes e moradores, como jovens que estavam em bares e nas ruas do bairro. como o jovem Kauã Brener Gonçalves Miranda, de 17 anos, que estava com amigos. “Todo mundo gostava dele. Era um irmão bom. Não entendemos o que aconteceu. Minha mãe está a base de remédios com essa tragédia”, disse uma irmã. Ou o ajudante de pedreiro Rafael Menezes Alves, 26 anos. “Meu irmão era nascido e criado aqui. Ele era ajudante de pedreiro e estava na rua quando tudo aconteceu. Ele estava bebendo com os amigos quando os policiais arrastaram ele e fizeram isso”. Ao site Metrópoles, moradores denunciaram corpos degolados e pessoas arrancadas de dentro de casa. Há fotos de pichações de uma milícia, feita na manhã de hoje (22), com a frase “obrigado pela recepção” (foto abaixo).

As mensagens sugerem que a causa seria a entre e traficantes ou uma tentativa de confundir as investigações. Testemunhas afirmam que a chacina foi praticada por policiais militares — Foto: Reprodução

Quem vive no bairro diz que “tinham pais de família” entre as vítimas. Relatam que pessoas envolvidas com o varejo do tráfico também estão entre os mortos. No entanto, moradores destacam que “eles não precisavam ser mortos”, destacando o caráter de execução.

“Tinham pessoas envolvidas com o crime? Tinham. Mas a grande maioria não tem nada com o fato. Muitas pessoas estão desfiguradas. Se eles tivessem a intenção de prender, não teriam feito isso. Quem correu se salvou. Essas mortes aconteceram de ontem para hoje. (Os policiais militares) passaram de sábado para domingo e ontem durante o dia eles saíram e voltaram. Se fosse troca de tiros, os jovens não estariam assim. Eles fizeram uma chacina. Resgatamos os corpos e não achamos nenhuma arma. Morreu um PM em um dia e no outro eles fizeram uma chacina”, denuncia um morador da favela.

“Meu pai está lá dentro”, afirma uma jovem moradora de 21 anos, manicure e que mora no bairro há cinco anos. Ela diz que o pai, um comerciante de 43 anos, está entre os desaparecidos e feridos dentro do manguezal. Ela contou à reportagem do Jornal Extra que falou com o pai por telefone. No entanto, o aparelho do comerciante ficou sem sinal.

“Meu pai é trabalhador e moramos há mais de cinco aqui. Ele estava voltando do trabalho por volta de 15h desse domingo. Na hora do tiroteio, meu pai correu para dentro do mangue. Ele diz que ficou no meio do tiroteio. Só estava tentando vir para casa. Disse que outras pessoas estavam dentro do mangue. Estou com medo e creio que ele esteja vivo. Desde ontem, ele manda mensagem. Mas agora de manhã ele perdeu o sinal. Acreditamos que muitas pessoas estejam mortas”, denuncia a jovem.

Corpos das vítimas da chacina no Conjuntos de Favelas do Salgueiro, em São Gonçalo, Rio de Janeiro — Foto: Reprodução

A chacina ocorreu na mesma região, no Complexo do Salgueiro, em que em novembro de 2017, oito pessoas foram mortas com 35 tiros de fuzil, durante uma operação envolvendo militares do Exército. Dois inquéritos foram abertos para apurar o caso, mas foram arquivados sem identificar os culpados. Em maio de 2020, o menino João Pedro Mattos, de 14, foi baleado quando brincava com amigos dentro de casa, durante uma operação conjunta das polícias Federal e Civil no Salgueiro.

é governada desde o início do ano por uma gestão apoiada e alinhada ao presidente Jair Bolsonaro. O prefeito, Capitão Nelson, é ex-policial e se elegeu prometendo enfrentar a ação dos criminosos no município. Nos dias que antecederam as eleições, circularam denúncias que associavam o passado do político a grupos de extermínio, com o carro da linguiça, que circula nos bairros. Nelson foi citado pela CPI das Milícias como líder de uma facção que agia no bairro Jardim Catarina.

Com o objetivo de justificar as mortes, o tenente-coronel Major Blaz, porta-voz da PM, informou que a grande maioria dos mortos estavam vestidos com roupas ou itens de camuflagem. Como se usar “roupa camuflada” fosse um crime. Os moradores que retiraram os corpos do mangue, disseram não ter encontrado armas.

* Com informações do Esquerda Online

Mídia1508

A 1508 é um coletivo de jornalismo independente anticapitalista, dedicado a expor as injustiças sociais brasileiras e a noticiar as mobilizações populares no Brasil e no mundo.

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