Protestos contra a polícia têm 16 mortos e centenas de feridos no Quênia

Manifestações pelo país para prestar homenagem às mais de 60 pessoas assassinadas pela polícia durante os protestos do ano passado sofreram mais violência policial e mortes.

Manifestantes apedrejam um canhão de água da polícia antimotim do Quênia no centro de Nairóbi, capital do país, 25 de junho de 2025 — Foto: Tony Karumba/Agence France-Presse — Getty Images

Pelo menos 16 pessoas foram mortas e 400 ficaram feridas no Quênia, durante uma manifestação nacional contra o governo e a violência policial, na manhã da última quarta-feira, dia 25 de junho. Os protestos foram reprimidos pela polícia em diferentes partes do país.

Os milhares de quenianos foram às ruas para prestar homenagem às mais de 60 pessoas assassinadas pela polícia nos protestos do ano passado, que culminaram em uma tentativa de invadir o parlamento, enquanto os parlamentares aprovavam uma lei para aumentar os impostos – que posteriormente foi revogada pela forte mobilização no país.

O diretor executivo da Anistia Internacional do Quênia, Irũngũ Houghton, disse à Reuters que o número de mortos havia sido verificado pela Comissão Nacional de Direitos Humanos do Quênia (KNCHR), órgão que é financiado pelo governo. “A maioria foi morta pela polícia”, disse ele.

“Alguns manifestantes entraram em confronto com a polícia, e 16 pessoas foram confirmadas como mortas”, disse Houghton, acrescentando que os números foram verificados pela organização global de direitos humanos e pela KNCHR.

“Mais de 400 vítimas foram relatadas, incluindo manifestantes, policiais e jornalistas”, disse a KNCHR em uma declaração compartilhada em sua conta oficial no X, antigo Twitter.

Uma declaração conjunta de grupos que apoiam os protestos disse que 83 pessoas ficaram gravemente feridas e pelo menos oito pessoas estavam sendo tratadas por ferimentos à bala.

“Rezamos por nossa nação, pelo diálogo e por um caminho a seguir para sair do impasse político que o Quênia enfrenta”, disse a declaração da Ordem dos Advogados do Quênia (LSK), do Grupo de Trabalho de Reformas Policiais e da Associação Médica do Quênia.

Revoltados, manifestantes enfrentam a repressão policial durante protesto, 25 de junho de 2025 — Foto: Luis Tato/Agence France-Presse – Getty Images

No centro de Nairóbi, capital do país, onde muitos negócios estavam fechados, milhares de pessoas se reuniram para a marcha, agitando bandeiras quenianas e cartazes com imagens de vítimas dos protestos do ano passado.

Outros acenderam fogueiras nas ruas e gritaram palavras de ordem contra William Ruto, presidente do Quênia. Mais tarde, a violência se instalou, com a polícia disparando gás lacrimogêneo, canhões de água, atacando manifestantes com cassetetes e armas de fogo, que responderam atirando pedras e outros objetos.

As marchas também resultaram em confrontos entre civis e policiais nas cidades de Mombasa, Nakuru e Kisumu, além de outras partes do país. Manifestantes incendiaram partes de prédios judiciais na cidade de Kikuyu, no condado de Kiambu.

A Autoridade de Comunicações do Quênia ordenou que emissoras de TV e rádio interrompessem a cobertura ao vivo dos protestos, ameaçando com medidas regulatórias aqueles que não seguissem a diretriz. Diversas emissoras foram retiradas do ar.

Grandes multidões foram vistas mais cedo indo em direção à State House, residência oficial do presidente, em cenas transmitidas pelos canais quenianos NTV e KTN, antes que fossem retirados do ar. Ambos os canais retomaram as transmissões mais tarde, depois que um tribunal em Nairóbi suspendeu a ordem emitida pela Autoridade de Comunicações do Quênia.

Parlamentares deixaram os prédios do parlamento em Nairóbi, e os protestos continuaram a se intensificar no centro da cidade. Em outras regiões, multidões marcharam pelas principais vias em direção à capital.

Os protestos expuseram mais uma vez a profunda raiva contra o governo assassino de William Ruto, 25 de junho de 2025 — Foto: Luis Tato/Agence France-Presse – Getty Images

Revolta contra a polícia

A indignação tem crescido no Quênia nos últimos anos devido à corrupção, o desemprego, o aumento do custo de vida e a violência policial. Os protestos acontecem em meio a manifestações do ano passado, motivadas por propostas de aumento de impostos, nas quais dezenas de pessoas morreram e muitas outras desapareceram.

Os protestos de rua diminuíram com o tempo, mas assassinatos, prisões e desaparecimentos continuaram, gerando mais ódio contra a polícia.

Dois assassinatos no mês de junho — a morte do professor Albert Ojwang sob custódia policial após supostamente criticar um alto funcionário da polícia nas redes sociais, e o tiro disparado pela polícia à queima-roupa contra o vendedor Boniface Kariuki durante um protesto pela morte de Ojwang — inflamaram ainda mais a revolta popular.

Stephanie Marie, uma jovem manifestante em Nairóbi, disse ao The Guardian que estava na marcha de quarta-feira (25/06) por causa de Ojwang. “Pode ser meu irmão, pode ser meu primo, pode ser qualquer um”, disse ela. “São apenas garotos normais, fazendo coisas normais.”

Ela pediu aos líderes que prestassem atenção ao que estavam dizendo: “O povo votou. Vocês estão aqui pelo povo. Vocês estão trabalhando pelo povo… só queremos que vocês ouçam o povo. É isso.”

Outro jovem manifestante em Nairóbi, Innocent, estava protestando pela perda de seu amigo nas manifestações do ano passado. Ao The Guardian, ele disse que foi exposto a muito gás lacrimogêneo da polícia na manifestação, mas que ele era “imparável”.

“Os jovens são imparáveis”, disse ele. “Porque viemos lutar pelos nossos direitos.” E acrescentou: “Não queremos uma liderança ruim.”

Seis pessoas, incluindo três policiais, foram acusadas de homicídio na terça-feira (24/06) pelo assassinato do blogueiro e professor Albert Ojwang, de 31 anos. Todos se declararam “inocentes”.

A morte de Ojwang se tornou um motivo para os quenianos que ainda lamentam aqueles que morreram nas manifestações do ano passado pela polícia, em um cenário de dezenas de desaparecimentos inexplicáveis. “Estamos lutando pelos direitos dos nossos jovens, dos quenianos e das pessoas que morreram desde 25 de junho… queremos justiça”, disse Lumumba Harmony, um manifestante, à Reuters em Nairóbi.

As cenas sem precedentes de 25 de junho de 2024, em que a polícia atira em pessoas desarmadas enquanto eles rompiam barreiras para entrar no parlamento, criaram a maior crise da presidência de Ruto.

Manifestantes incendeiam as ruas e o distrito comercial central de Nairóbi, capital do país, 25/06/2025 — Fotografia: EPA
Manifestantes no centro de Nairóbi estavam entre os milhares que marcharam por todo o país, 25 de junho de 2025 — Foto: Luis Tato/Agence France-Presse – Getty Images
Policiais espancam manifestante; a contínua falta de responsabilização pela violência policial e as dificuldades econômicas alimentam as manifestações deste ano — Foto: Kabir Dhanji/Agence France-Presse – Getty Images
Manifestantes incendeiam as ruas e o distrito comercial central de Nairóbi, capital do país, 25/06/2025 — Fotografia: EPA

Mídia1508

A 1508 é um coletivo anticapitalista de jornalismo independente, dedicado a expor as injustiças sociais e a noticiar as mobilizações populares no Brasil e no mundo.

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