Manifestantes furiosos na cidade mais pobre do país denunciam aplicação da quarentena contra o novo coronavírus sem ajuda do governo.
A cidade do Líbano, Trípoli, testemunhou sua terceira noite seguida de uma verdadeira revolta popular, com centenas de pessoas tomando as ruas para denunciar as duras condições de vida e a escassa ajuda do governo durante o bloqueio por causa da pandemia de Covid-19.
As forças de repressão do Estado usaram canhões de água na quarta-feira (27) na tentativa de dispersar a multidão, que tentava invadir um prédio oficial perto da Praça Al Nour, no centro da cidade.
A praça se tornou um centro de encontro e ação de protestos durante o levante no Líbano em outubro de 2019, contra a classe política do país, cuja corrupção e má gestão levou o país a uma crise financeira devastadora.
Os últimos protestos ocorreram quase três semanas após um lockdown em todo o país, que visa impedir o colapso do setor de saúde do país em meio a um aumento significativo no número de novos casos e no número de mortes relacionadas ao novo coronavírus. A pequena nação mediterrânea de cerca de seis milhões de habitantes registrou até agora mais de 285.000 casos e 2.477 mortes, com um recorde de 73 mortes na terça-feira.
O forte bloqueio, que força praticamente todos os negócios a fecharem e quase todos a ficarem em casa, foi implementado sem apoio econômico do governo, em um país onde mais da metade da população é pobre.
“As pessoas estão com raiva e dizem que não podem mais sobreviver … ou fazer face às despesas”, disse Zeina Khodr, jornalista da Al Jazeera, relatando de Trípoli, acrescentando que os manifestantes na “cidade mais empobrecida” do Líbano denunciaram o bloqueio como “mais um fardo à sua luta”.
“Muitos trabalham no setor informal, o que significa que não recebem ajuda do governo”, disse Khodr.
Pelo menos 47 civis ficaram feridos desde o início dos protestos na noite de segunda-feira, com pelo menos uma dúzia precisando de hospitalização, de acordo com dados da Cruz Vermelha Libanesa.
Alguns vídeos dos protestos de quarta-feira (27) mostram coquetéis molotov sendo jogados por manifestantes em um prédio oficial, ao fundo, a multidão aplaude. Coquetéis molotov também foram lançados contra as forças de repressão em noites anteriores, e carros foram incendiados.
O Exército e tanques de guerra foram colocados nas ruas da cidade para reprimir a população. Os soldados usaram uma grande quantidade de gás lacrimogêneo e tiros de balas de borracha contra a multidão.
Tiros de arma de fogo foram denunciados por manifestantes. Assista:
Grupos menores de manifestantes realizaram suas próprias manifestações em todo o país na terça e quarta-feira, incluindo na capital, Beirute, no leste do Vale do Bekaa e no sul de Jiyeh e Tiro.
O bloqueio atual está programado para permanecer em vigor até 8 de fevereiro. O governo planeja iniciar uma campanha de vacinação em meados de fevereiro, com o ministro interino da Saúde, Hamad Hasan, dizendo que pretendem vacinar 80 por cento da população até o final do ano.
Nesta quinta-feira (28), um jovem foi morto em Trípoli, durante confrontos entre a polícia e manifestantes. Testemunhas e a imprensa local disseram que a tropa de choque atirou em pessoas desarmadas quando os manifestantes tentavam invadir o prédio do governo da cidade.
“As pessoas estão cansadas. Há pobreza, miséria, bloqueio e não há trabalho (…) Nosso problema são os políticos”, disse Samir Agha, um manifestante que participava do protesto, a um jornal local.
Foi a terceira noite consecutiva de forte mobilização popular.