Revolta contra a reforma da previdência no Peru

Os protestos começaram no dia 20 de setembro, desencadeados por uma reforma previdenciária aprovada no início do mesmo mês, segundo a qual os jovens serão obrigados a contribuir para um fundo de pensão privado.

Um policial sofreu queimaduras de primeiro grau causadas por um coquetel molotov durante o protesto contra o governo de Dina Baluarte, no dia 28 de setembro — Foto: Ângela Ponce/Reuters

Milhares de pessoas protestaram contra o governo da presidente peruana Dina Boluarte e o Congresso no último fim de semana. Os manifestantes marcharam em direção às sedes do governo no centro de Lima, no Peru.

Manifestantes atiraram pedras, coquetéis molotov e fogos de artifício contra a repressão policial, que responderam com gás lacrimogêneo e tiros de balas de borracha.

O Coordenador Nacional de Direitos Humanos (CNDDHH), uma coalizão de direitos humanos, relatou no domingo (28/09) que 18 pessoas ficaram feridas nos confrontos, incluindo um jornalista. Um policial sofreu queimaduras de primeiro grau causadas por um coquetel molotov.

O CNDDHH culpou a polícia pela violência. “Pedimos à polícia que respeite o direito de protestar. Não havia justificativa para o uso de grandes quantidades de gás lacrimogêneo, muito menos para atacar pessoas”, disse Mar Perez, advogada da CNDDHH.

Os protestos começaram no sábado, 20 de setembro, desencadeados por uma reforma previdenciária aprovada no início do mesmo mês, segundo a qual os jovens serão obrigados a contribuir para um fundo de pensão privado.

O índice de aprovação de Boluarte está na casa de um dígito há meses e muitos peruanos dizem que querem que ela deixe o cargo.

Os manifestantes, em sua maioria jovens, foram acompanhados por trabalhadores do transporte que dizem que o governo não está fazendo o suficiente para combater a extorsão. Motoristas de táxi e ônibus dizem que gangues os ameaçam para pagar “dinheiro de proteção”.

Eles também acusam a polícia de ignorar a extorsão generalizada. Alguns seguravam cartazes com os dizeres “Exigimos uma vida sem medo”.

O Congresso de maioria conservadora enfrenta uma situação semelhante devido à corrupção, de acordo com várias pesquisas de opinião.

“Estamos marchando contra a corrupção, pela vida, e contra o crime que nos mata todos os dias”, disse Adriana Flores, engenheira de 28 anos, à agência de notícias AFP no domingo.

Muitos peruanos criticam o Congresso, acusando o legislativo de não representar os interesses do povo.

“Essas pessoas [membros do Congresso] aumentam seus próprios salários, nos matam como moscas e não se importam com nada. Precisamos de uma mudança total, estamos cansados ​​dessa situação”, disse uma jovem ao site de notícias local RPP.

A presidente Boluarte, que tomou posse como presidente depois que seu antecessor sofreu impeachment por tentar dissolver o Congresso em 2022, dobrou seu salário em julho — uma medida que muitos chamaram de “ultrajante” diante de seus baixos índices de aprovação.

Seu mandato termina em julho do ano que vem.

Manifestantes entram em confronto com a polícia de choque em Lima — Foto: Connie França/AFP

A influência de lutas pelo mundo

Omar Coronel, especialista em Movimentos Sociais da Pontífica Universidade Católica (PUC) do Peru, disse à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, que “quem protagoniza os protestos são, sobretudo, jovens que agora estão ingressando no mercado de trabalho e descobrindo as limitações e dificuldades que vão encontrar”.

Mas os motivos desse mal-estar não são apenas econômicos. “Há uma grande rejeição à presidente Boluarte e seus aliados no Congresso devido ao crescente autoritarismo que vem sendo imposto no Peru.” E alguns acontecimentos internacionais parecem ter incentivado as manifestações.

“Os protestos que derrubaram o governo no Nepal ou os que ocorreram na Indonésia inspiraram o que estamos vendo agora no Peru”, afirmou o especialista em Relações Internacionais Ramiro Escobea.

Coronel também percebe a influência.

“No Peru, já fazia um tempo que as pessoas não se atreviam a protestar pelo alto custo que isso teve na onda de manifestações de 2023, que deixou dezenas de civis mortos. Mas o exemplo do Nepal parece ter ensinado que é possível conquistar mudanças, até mesmo em contextos mais autocráticos que o peruano, por meio de mobilizações.”

Os coletivos estudantis estão entre os mais ativos em uma onda de protestos que cresce, mas também jovens não universitários têm participado.

Os manifestantes tentaram invadir a sede do Congresso no Peru — Foto: Sebastián Castaneda/Reuters

A reforma da previdência

Os primeiros protestos surgiram em resposta à reforma do sistema previdenciário aprovada pelo Congresso peruano.

A nova lei obriga os trabalhadores autônomos a contribuir com o sistema público de aposentadorias, mas limita ao mínimo o valor que os menores de 40 anos podem sacar antecipadamente.

A reforma irritou muitos jovens em um país onde os políticos de diferentes partidos protagonizam escândalos de corrupção dia após dia.

“Sou trabalhador autônomo e quando soube que a reforma iria tirar parte da minha renda, decidi que era hora de sair para protestar”, disse Jorge, estudante de História da Universidade Nacional Maior de San Marcos, em Lima, que prefere não falar seu sobrenome por medo de retaliações.

Jorge trabalha como professor em uma escola enquanto completa seus estudos e sente que a situação no Peru se tornou inaceitável.

“Entre os jovens, o descontentamento é total”, afirma.

Embora os líderes parlamentares tenham anunciado rapidamente que os pontos mais polêmicos da reforma seriam eliminados, a lei continua em vigor e os manifestantes pedem pela revogação.

Mídia1508

A 1508 é um coletivo anticapitalista de jornalismo independente, dedicado a expor as injustiças sociais e a noticiar as mobilizações populares no Brasil e no mundo.

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