Indígena Guarani sofre atentado a tiros no Paraná

Ava-Guarani Donecildo Agueiro / Foto: Acervo pessoal

Na última terça-feira (6/11) o indígena Guarani Donecildo Agueiro, de 21 anos, sofreu um atentado a tiros no município de Guaíra, no Paraná. Ele saia de uma reunião da Coordenação Técnica Regional da Fundação Nacional do Índio (Funai), quando foi vítima do ataque. O jovem encontra-se internado no Hospital Regional de Toledo. Donecildo não sente mais as pernas desde que foi atingido.

Segundo uma liderança da comunidade de Tekoha Y’Hovy, o cenário enfrentado pelos Guarani na região é bastante crítico:

“Sofremos constantes ameaças, racismo, violência com arma de fogo, entre outras agressões. Os casos são extremamente recorrentes, inclusive com sequestro de indígenas para o Paraguai.”

O atentado acontece poucos meses depois da publicação do relatório de delimitação da Terra indígena Tekoha Guasu Guavira, de 1.136 hectares, que se estendem pelos municípios paranaenses de Guaíra, Altônia e Terra Roxa. A liderança vê uma clara relação entre esse fato e o ataque, que atribui à ação de uma financiada por fazendeiros locais: “Esse grupo tem função única e exclusiva de intimidar e acuar, ainda mais, as comunidades indígenas. Não sabemos mais para quem pedir socorro” desabafa.

Ou seja, é uma verdadeira organização terrorista. E que ainda age com a cumplicidade do Estado. No caso de Donecildo, a Civil de Guaíra não queria nem mesmo registrar o Boletim de Ocorrência do crime. “O registro foi feito somente após a presença de um representante da na Delegacia”, relata uma ativista do Conselho Indigenista Missionário. “Não é a primeira vez que essa recusa é manifestada, infelizmente” acrescenta.

De acordo com levantamento do Relatório “Violência contra os povos indígenas – Dados 2017”, o tem 20 territórios tradicionais em situação de total omissão e 19 com o processo de demarcação inacabado.

Guarani na cidade de Guaíra, Paraná / Foto: Diego Pelizzari/Cimi

As consequências da não demarcação repercutem em todos os aspectos da vida desse povo originário. Os governos municipais e estadual usam o argumento da não regularização das terras para se eximirem da prestação de serviços básicos, como transporte escolar, construção de escolas nas aldeias, fornecimento de água e garantia de acesso a hospitais e postos de saúde. Falta de terra, contaminação das águas por agrotóxicos, desnutrição e malária são apenas alguns dos problemas enfrentados pela etnia no oeste do Paraná.

Os Guarani da região são ainda alvo de perseguição por parte da Itaipu Binacional, estatal brasileira-paraguaia. São cinco pedidos de reintegração de posse movidos pela empresa contra os indígenas. Em agosto deste ano, o juiz federal Sérgio Luis Ruivo Marques, da 1ª Vara Federal de Foz do Iguaçu, decidiu acatar um deles, colocando 15 famílias, com crianças e idosos, sob risco iminente de despejo.

Chamada pelos índios de Tekoha Mokoi Joegua, a comunidade nasceu da retomada de uma terra que era ocupada por eles até serem expulsos pela ditadura militar, para a construção da hidrelétrica de Itaipu. Vigorava entre o alto comando brasileiro a ideia de que nas indígenas em área de fronteira poriam em risco “a soberania nacional”. Uma ideologia que é reproduzida até hoje.

Tekoha Mokoi Joegua / Foto: Osmarina de Oliveira/Cimi-Sul

Em março de 2018, cinco indígenas de Mokoi Joegua foram presos. A Polícia alegou que eles estariam cometendo “crime ambiental”, ao coletar taquara, bambu nativo usado em construções e rituais. A ironia é que a acusação acontece em um local que atualmente é uma ilha no lago artificial criado pela usina, um dos empreendimentos de maior impacto ambiental na história do país. Mas no discurso policial quem destrói a natureza são os índios catando bambus!

O incidente ainda serviu de pretexto para mais intimidações e abusos por parte das autoridades.  Os cinco receberam socos e chutes dos agentes da repressão, além de ouvirem ameaças  de morte contra membros da comunidade. A denúncia é uma das que foram feitas naquele mês pelo Conselho Continental da Nação Guarani (CCNAGUA), em uma nota dirigida à Itaipu Binacional.

“Os senhores não podem furtar-se dessa dívida que cobraremos sempre enquanto vivermos, porque as terras são nossas vida, são a base de nossa cultura. Se nos anos 1970 e 1980 quando Itaipu foi construída expulsaram nosso povo e queimaram nossas casas, agora não podemos permitir que isso se repita”, afirma o documento.

Na margem direita do rio Paraná, foram pelo menos as 36 aldeias inundadas pela hidrelétrica.  Na margem esquerda, outras 19, no mínimo. Antes mesmo da consolidação de Itaipu, o avanço das obras gerou uma onda de legalização fundiária de posses irregulares, feita às pressas pelo Instituto de Colonização Agrária (Incra).

Pressionadas pela inundação e a grilagem, as famílias Guarani tiveram que sair. “Ou corria, ou morria”, é uma frase ouvida frequentemente no relato dos mais velhos. Foram removidas cerca de 42 mil pessoas da área. Até hoje, os Guarani nunca foram reparados ou ressarcidos. Seguem em busca de justiça.

Mídia1508

A 1508 é um coletivo de jornalismo independente anticapitalista, dedicado a expor as injustiças sociais brasileiras e a noticiar as mobilizações populares no Brasil e no mundo.

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