Os terroristas vestem fardas

Mais uma chacina. Mais cinco jovens negros e pobres executados pela PM.

Os jovens foram assassinados dentro do carro por PMs — Foto: Reprodução

No último sábado (28/11/2015), policiais militares do 41º BPM fuzilaram o carro de cinco jovens negros no Morro da Lagartixa, no Complexo da Pedreira, em Costa Barros. Os jovens voltavam do Parque de Madureira, onde ocorria uma festa. Segundo moradores do bairro, que chegaram logo após a chacina, os policiais militares tentaram forjar um auto de resistência, impedindo inclusive o socorro às vítimas pelas pessoas que se encontravam no local.

Eles alteraram a cena do crime, pegaram a chave do carro da mão do motorista morto, colocaram lá dentro uma pistola para dizer que aqueles jovens eram bandidos, disse um morador.

Os amigos de infância Roberto de Souza, 16 anos, Carlos Eduardo da Silva Souza, 16, Cleiton Corrêa de Souza, 18, Wesley Castro, 25, e Wilton Esteves Domingos Junior, 20, são as novas vítimas de mais essa chacina policial.

Os policiais que executaram os jovens foram presos em flagrante – por fraude processual e homicídio doloso – graças a população local que rapidamente denunciou o crime, tanto pela internet, em redes sociais, com fotos e vídeos, como testemunhando na 39º Delegacia da Pavuna.

Os assassinos são: Thiago Resende Miranda, Márcio Darcy Alves dos Santos, Antônio Carlos Gonçalves e também Fábio Pizza de Oliveira da Silva, este último preso apenas por ter alterado a cena do crime.

[…] Eles foram comemorar o primeiro salário que um deles tinha recebido, quando soubemos dos tiros, corremos para o local, quando cheguei lá meu sobrinho ainda estava agonizando, tentei socorrer e fui impedida por esses monstros, relatou a tia de uma das vítimas.

É importante esclarecer o papel da polícia e o que significa mais essa chacina, que não é a primeira e nem será a última. A polícia é uma ferramenta do Estado (classe dominante) para o controle social e defesa da propriedade privada. Ela cumpre seu papel de controle social através da aplicação sistemática de terror – terrorismo de Estado – contra a população pobre e negra. A execução de jovens negros em favelas e periferias é parte do cotidiano, não o contrário. Portanto, não é despreparo ou mero desvio de conduta. A polícia é preparada para matar e reprimir pobre.

Carlos Eduardo, 16, Roberto de Souza, 16 anos, Cleiton Corrêa, 18, Wilton Esteves, 20, e Wesley Castro, 25.

Auto de resistência é licença para matar

Outro ponto a se destacar. É mais um caso que por pouco não se enquadrou em “auto de resistência”, termo usado por policiais que alegam estar se defendendo ao matar um suspeito. Prática usual da polícia política da época da ditadura militar e que nunca acabou nas favelas e periferias. Execuções sumárias que se “transformam” em auto de resistência. Uso recorrente da polícia e reconhecido inclusive por organizações de direitos humanos como licença para matar.

[…] Então liguei a lanterna do telefone e reconheci as vítimas, cai em lágrimas! Inclusive um eu vi criança correndo e pulando, comprando doces na venda da esquina, disse outro morador.

Pai de uma das vítimas, Carlos Henrique do Carmo Souza, disse que o filho Carlos Eduardo da Silva Souza tinha acabado de concluir um curso de Petróleo e Gás e se preparava para tentar concurso para a Marinha. “Eles chegaram a levantar os braços para fora e gritaram que eram moradores, mas não teve jeito”, inconformado.

Há 18 dias, ele teve outro familiar ferido vítima da violência. “Minha enteada estava na porta de casa brincando quando foi baleada na perna. Ela só tem oito anos e está com a bala alojada na perna. Minha esposa ficou desesperada. Agora isso com meu filho“, disse Carlos, visivelmente emocionado.

Para o padrasto de Cleiton, Jorge Vieira, de 61 anos, os policiais não deram chance aos rapazes sequer de se identificar. “Nossos filhos vinham do Parque de Madureira e esses policiais não deram chance deles se defenderem. Não tenho nem palavras para falar. Minha mulher está em estado de choque”, afirmou. Cleiton trabalhava em um lava-jato com os outros dois irmãos.

“Foi uma execução! Mataram o meu filho e todos os colegas que estavam com ele. Eu fui ao Parque Madureira com os meninos e passei pelo local dez minutos antes, e pouco depois os policiais fazem uma desgraça dessa”, disse aos prantos, o estudante de direito Jorge Roberto Lima da Penha, pai de Roberto de Souza Penha.

Outros dois irmãos de Wesley e Wilton, que estavam em uma motocicleta acompanhando o carro dos amigos, conseguiram escapar dos tiros, mas caíram e se feriram levemente. Eles informaram as famílias.

Não há saída dentro da burocracia das instituições do próprio Estado. Denunciar a polícia para a própria polícia não resolverá. Nunca resolveu.

Exemplos não nos faltam. A chacina de Vigário Geral (1993), os policiais continuam livres; a chacina da Maré (2013), os policiais do BOPE sequer foram investigados; e tantas outras chacinas policiais. O Estado não julgará a si próprio. O povo precisa cada vez mais se organizar e encontrar suas próprias ferramentas de autodefesa contra esse Estado terrorista.

Rafael Daguerre

Fotógrafo, Repórter, Editor e Documentarista

Um dos fundadores da Mídia1508. "Ficar de joelhos não é racional. É renunciar a ser livre. Mesmo os escravos por vocação devem ser obrigados a ser livres, quando as algemas forem quebradas" ― Carlos Marighella.

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