Angola testemunhou na semana passada inúmeras manifestações que começaram com uma greve de três dias de motoristas de táxi e de micro-ônibus. Os protestos são contra o aumento do preço dos combustíveis — em um país rico em petróleo.
Milhares de pessoas se juntaram às manifestações que iniciaram na capital, Luanda, e se espalharam para outras regiões do país.
O número de mortos chegou a 22 na quarta-feira (30/07), com 197 feridos e 1.515 prisões, de acordo com um comunicado do próprio governo. Mais de uma centena de estabelecimentos comerciais e dezenas de viaturas foram destruídas.
A violência eclodiu na segunda-feira, dia 28/07, quando motoristas de candongueiros — micro-ônibus que transportam quase 90% dos passageiros de Luanda — iniciaram a greve.
A revolta com o aumento dos preços e a fome levou a população a saquear mercados, lojas e confrontar a violência da polícia.
“Lamentamos 22 mortes, incluindo a de um policial”, disse o ministro do Interior, Manuel Homem, aos jornalistas em uma reunião do Conselho de Ministros presidida pelo presidente angolano João Lourenço.
O governo busca criminalizar os protestos afirmando que “elementos com intenções criminosas transformaram a manifestação em uma ameaça à segurança.” No entanto, as imagens apresentam outra história.
Angola tem 36 milhões de habitantes, com uma inflação de cerca de 20% e uma taxa de desemprego de quase 30%.
“O governo parece ignorar a sua população”, disse Daniel Pedro, 32 anos, morador de Luanda, à agência de notícias francesa AFP.
“Dizem que a juventude é o futuro de amanhã, mas hoje ela está desempregada. Tenho uma profunda sensação de insegurança”, disse uma manifestante que se identificou como professora.
A inflação e o crescimento limitado provavelmente manterão as taxas de pobreza altas, em torno de 36% até 2026.

Riqueza petrolífera, raiva crescente
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África, atrás da Nigéria. Muitas pessoas afirmam não ver nenhum benefício na riqueza petrolífera angolana. “Este é um paradoxo com o qual vivemos desde a independência”, disse a ativista Laura Macedo ao jornal português RFI.
Ela criticou Lourenço por promover o 50º aniversário da independência de Angola enquanto grande parte da população continua sofrendo.
“Ele não pode ser um homem feliz. Como você pode aceitar que ainda haja crianças nas ruas e que a seca no sul de Angola continue matando pessoas?”, perguntou ela.
Angola enfrenta sérios desafios econômicos, apesar de ser um dos principais produtores de petróleo da África. Uma voz angolana afirma que isso se deve à má gestão do governo angolano.
A socióloga angolana Luzia Moniz disse à emissora internacional Deutsche Welle (DW) que, em relação ao vandalismo, “o vandalismo começa com o governo, que abandona os seus cidadãos”.
Moniz culpou o Estado angolano pela má condição econômica do país, onde 46 crianças morrem de desnutrição a cada dia e o desemprego juvenil está próximo de 60%.
Moniz questiona o governo angolano a se comprometer com o diálogo em vez da repressão violenta aos manifestantes. Ela pediu uma mudança de governo antes de 2027, quando termina o mandato de Lourenço.
Os protestos refletem a crescente indignação com a pobreza e a fome no país. O Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) governa o país desde que ele se tornou independente de Portugal em 1975.

Sindicalista preso e seu paradeiro é desconhecido
O sindicato dos taxistas, Associação Nacional dos Taxistas de Angola (ANATA), que convocou a greve, procurou se distanciar da revolta. Seu líder, Geraldo Wanga, condenou a violência e afirmou que seus membros não estavam envolvidos nas ações. Ele criticou o que chamou de prisão arbitrária de motoristas injustamente acusados de incitação à violência.
Maria Cativa, irmã mais velha de Rodrigues Cativa, revela que elementos do Serviço de Investigação Criminal (SIC) detiveram o ativista quinta-feira (31/07) passada, na província de Benguela, momentos depois de ele ter apelado nas redes sociais pelo regresso de seus colegas ao trabalho.
“Eles chegaram em casa às 14 horas, não nos informaram nada, não apresentaram nenhum mandado de prisão”, disse a irmã do vice-presidente da ANATA. “A única coisa que eles disseram foi ‘vamos te levar para você desconfirmar aquilo que falou’.”
A família ficou surpreendida, acrescenta Maria Cativa, que até hoje não sabe nem o paradeiro, nem os motivos da detenção do sindicalista: “Até aqui, nós não conseguimos ver o meu irmão e não nos dizem nada.”
O Serviço de Investigação Criminal não se pronuncia sobre o assunto.
Nas redes sociais, o presidente da ANATA, Francisco Paciente, confirmou a detenção de Rodrigues Cativa.

