O dia 31 de março marca o golpe militar de 1964, que instaurou uma ditadura que durou 21 anos no Brasil, resultando em censura, perseguição política, torturas e assassinatos. Para que a memória dessa ruptura democrática permaneça viva, movimentos sociais, familiares de vítimas e instituições promoveram atos públicos em diversas cidades do país.
A história do Brasil tem marcas que não devem ser apagadas. A luta contra a ditadura segue viva, seus apoiadores permanecem no poder e a memória é parte fundamental para não esquecer os horrores desse período.
No Rio de Janeiro, durante o ato contra a ditadura militar, que completou 61 anos nesta segunda-feira (01.04), integrantes da extrema direita brasileira, apoiadores do regime, estiveram na manifestação atuando com a prática de provocação de sempre. Identificaram-se como integrantes do Partido Liberal (PL) e do Partido Novo (NOVO). Ao lado da polícia, que conversava com um dos integrantes do PL minutos antes, eles estenderam a bandeira de Israel em apoio ao genocídio palestino.
A provocação não durou muito tempo. Os manifestantes do movimento estudantil enfrentaram a extrema direita e a polícia, e tomaram a bandeira de Israel que, em seguida, foi incendiada aos gritos de “Estado de Israel, Estado Assassino!” e “Viva a Luta do Povo Palestino”.
Manifestantes destacaram que a bandeira de Israel é uma bandeira sionista e muitos judeus antissionistas a queimam em protestos, o que não configura antissemitismo — afirmando uma posição antissionista.

Ditadura de 1964 e Israel
A defesa da extrema direita — do PL e do NOVO — ao regime militar e apoio à Israel não é mera coincidência. Documentos do Ministério das Relações Exteriores de Israel no Arquivo Nacional de Israel revelam que o Estado judeu, como muitos outros, estava pouco interessado no histórico de direitos humanos do Brasil durante a ditadura. Diplomatas israelenses no Brasil se concentravam em esforços de hasbara (propaganda) e na promoção da cultura israelense, além de discutir repetidamente a mudança da embaixada brasileira para Jerusalém.
Após o golpe militar de 1º de abril de 1964, a embaixada israelense elaborou um documento afirmando que o golpe “foi planejado e executado rapidamente e levou, em 24 horas, não apenas à queda de Goulart (o presidente na época), mas também à supressão de todos os elementos de esquerda […] O Brasil está hoje em um estado transitório que pode ser definido como uma ditadura militar com verniz parlamentar”. Em 16 de junho de 1965, Aryeh Eshel, diretor de assuntos latino-americanos do Ministério das Relações Exteriores, escreveu que esperava “que o atual regime no Brasil tenha uma longa vida”.
Um telegrama da embaixada israelense de 26 de setembro de 1966, sobre protestos estudantis antiditadura, relatava que “os slogans são sempre políticos e contra o regime. Não há dúvida de que elementos de esquerda estão explorando o ressentimento que existe entre os estudantes”. Em outro telegrama, de 15 de dezembro de 1966, a embaixada escreveu que “ninguém se importa com o que acontece com a ‘democracia’ no Brasil”. Alguns meses depois, um telegrama enviado a Jerusalém reclamava da dificuldade de promover propaganda israelense, pois “não há como usar grupos estudantis a nosso favor, já que essas organizações foram dissolvidas por seu esquerdismo. O mesmo vale para organizações de trabalhadores, que praticamente não existem mais”.

Medalha Chico Mendes de Resistência
A manifestação se somou à agenda nacional de mobilização convocada pela Frente Povo Sem Medo e Frente Brasil Popular, que se concentrou em frente ao antigo DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), no Centro do Rio de Janeiro. DOPS eram unidades de repressão — tortura e execuções — da polícia política da ditadura militar.
Em seguida, o protesto caminhou pelas ruas do Centro da cidade até a Associação Brasileiro de Imprensa (ABI), onde ocorreu a 37ª Medalha Chico Mendes de Resistência, organizada pelo Grupo Tortura Nunca Mais, que completa 40 anos em 2025.
Foram entregues Medalhas Chico Mendes em homenagem à pessoas que lutaram (In Memoriam) e lutam por Democracia e Direitos Humanos.
Um dos momentos mais impactantes foi Medalha Chico Mendes para Mãe Bernadete, assassinada com 25 tiros por defender os direitos quilombolas e lutar por justiça na Comunidade Quilombola de Pitanga de Palmares em Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador, Bahia.
Antes de ser executada, Bernadete perdeu seu filho Flávio Gabriel Pacifico dos Santos, 36 anos, conhecido como Binho, também assassinado em 2017. Quem recebeu a medalha foi seu filho Wellington, comovendo a todos com um discurso forte e preciso em memória de sua mãe e irmão.

No marco dos 61 anos do golpe militar, a mobilização também pautou a situação atual da política brasileira e a tentativa de um novo golpe dos militares e do ex-presidente Jair Bolsonaro, cobrando responsabilização daqueles que atentaram contra a democracia em 2022.
Os homenageados pelo Grupo Tortura Nunca Mais:
- Dr. Laerte Vaz, militante e ex-presidente do CREMERJ;
- Ana Rosa Kucinsk Silva (in memorian), desapaecida pela ditadura;
- Joel Rufino dos Santos (in memorian), preso na ditadura e escritor;
- Agenda Nacional pelo Desencarceramento;
- Luiz Paulo da Cruz Nunes (in memorian), morto na ditadura;
- Mãe Bernadete e Binho do Quilombo (in memorian), quilombolas assassinados;
- José Maria Galhasi (in memorian), comunista histórico;
- Gláucia dos Santos, mãe de adolescente assassinado pelo Estado;
- Luta pela Educação Indígena do Pará;
- João Nogueira (in memorian), cantor e compositor.




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Com informações da Fepal Brasil.