Empresa demite 527 trabalhadores por WhatsApp

"Nunca vi uma empresa mandar as pessoas embora por WhatsApp. Em período de greve ainda por cima. Como é que pode isso?", disse Ubiratan.

Imagem: Reprodução

Os da terceirizada Emissão, contratada pela Companhia Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE), foram demitidos por se manifestarem contra as injustiças praticadas pela empresa. Sem receber há dois meses – salário, alimentação, transporte – os grevistas realizaram protestos contra a Emissão e a Cedae. Na quinta-feira, dia 20 de dezembro, os trabalhadores foram ao Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Saneamento e Meio Ambiente do e Região (SINTSAMA-RJ) para fazer a homologação da Emissão. Todos os afirmaram que foram coagidos pela empresa e pelo próprio sindicato a aceitar o acordo, caso não aceitasse, não receberiam nada.

Dentro do “acordo” está o parcelamento em 10 vezes dos direitos trabalhistas, que por lei devem ser pagos integralmente. A Emissão incluiu no parcelamento os salários atrasados há dois meses, a alimentação, o transporte e o 13° salário, direitos que já deveriam ter sido pagos e foram parcelados, o que revoltou ainda mais os funcionários – alguns não aceitaram o acordo e pretendem processar a empresa no Ministério do Trabalho.

“Eu tenho provas que a empresa me coagiu. Eu fiz uma gravação na hora que a funcionária da empresa estava me obrigando a assinar uma coisa que eu não queria. Por isso eu não assinei”, disse Danielle, trabalhadora demitida pela empresa Emissão.

As denúncias de ameaças e irregularidades da empresa são inúmeras. Silvio César, outro trabalhador demitido e que está na há 12 anos, relatou que um colega que está de licença por acidente de trabalho, também foi demitido. Outra colega, em licença maternidade, também está na lista de demissão. Silvio lembra que o acidente do colega foi gerado pelas péssimas condições de trabalho.

“Demitiram uma mulher no período de licença maternidade por WhatsApp”, relatou Silvio.

A revolta dos também é com o sindicato que nada fez para impedir as demissões e lutar pelo recebimento dos direitos não parcelados. Dentro do sindicato, além de funcionários da Emissão, estavam três seguranças armados da empresa. Um dos seguranças mostrou a arma para os trabalhadores com o objetivo de coagi-los, no momento em que cobravam dos sindicalistas uma postura mais forte contra a empresa.

“Nunca vi uma empresa mandar as pessoas embora por WhatsApp. Em período de greve ainda por cima. Como é que pode isso?”, disse Ubiratan.

“Ela usou nossa mão de obra e agora não quer executar o pagamento. Isso é o mínimo que nós temos direito. Hoje estamos na sede do sindicato e a empresa veio com homens armados para coagir os trabalhadores”, disse Vinicius, também demitido pela Emissão.

“A gente vai passar o final de ano com uma mão na frente outra atrás. Muitos estão sendo despejados. Eu mesmo pago pensão alimentícia, não pago praticamente há dois meses eu posso ser até preso, porque tudo que eu ganhava girava em torno dessa empresa, não tenho nenhuma outra renda a não ser a Emissão. Não tenho como arcar, qualquer momento eu posso ser preso”, afirma Silvio César, demitido depois de 12 anos de trabalho para a Cedae.

“Não existe pagamento liberado”

Hoje, dia 27 de dezembro, os não receberam nada, sequer o FGTS. Eles relatam que realizaram todos os procedimentos e a empresa deu cinco dias úteis para o recebimento, a partir da data do pedido. Acontece que a Caixa Econômica Federal diz que há irregularidades da empresa Emissão e o FGTS está retido, portanto, todo o procedimento terá que ser refeito, isso quer dizer que são mais – no mínimo – cinco dias úteis. Ninguém está conseguindo receber.

“Além de ter passado o Natal sem nada, agora o fundo de garantia que é uma mixaria mas que poderia dar um alívio, nem isso teremos. Digamos que a gente consiga fazer isso amanhã (28/12), a gente só vai receber alguma coisa em janeiro. Não tem nada tão ruim que não possa piorar”, contou Silvio César.

Veja abaixo os comprovantes.

A privatização da

A passa por uma precarização interna provocada por setores que querem a total privatização da estatal. Hoje a Cedae já funciona, em parte, como uma empresa privada. A estatal mantém um processo de terceirização cruel para os trabalhadores, que perdem seus poucos direitos trabalhistas. A contratação de dezenas de empresas terceirizadas é uma prática comum, segundo os próprios funcionários, que já estiveram em várias dessas empresas, obrigados a “pular” de uma para outra. Como funciona: terceirizando os serviços a Cedae tira sua responsabilidade direta com os desvinculando-os da estatal. Muitos chegam a ficar apenas seis meses em cada empresa. Funcionários com 12 anos de Cedae, na verdade, tem seus anos de trabalho fragmentados em diversas terceirizadas para que assim seus direitos relativos aos anos de trabalho sejam perdidos – direitos básicos como, por exemplo, as férias. Vários trabalhadores disseram que não tiram férias há mais de três anos.

Todas as grandes obras de saneamento foram realizadas com o dinheiro do povo, recurso público. Da maior Estação de Tratamento de do mundo (Guandu) à maior estação de bombeamento de água potável do mundo, o Lameirão. Se fossem construídas hoje, elas custariam cerca de R$ 15 bilhões. Sem contarmos com reservatórios, represas, tubulações, estações de tratamento de esgotos, emissários… e tudo isso está para ser vendido por singelos R$ 4 bilhões. A venda da Cedae é literalmente um roubo contra o povo brasileiro e à população fluminense. Não é somente a perda material, construído com o dinheiro público, mas se transformando em uma empresa privada, que força a população terá para influir nas decisões da Cedae? Se já existe uma enorme dificuldade de se garantir os direitos ao saneamento básico com uma empresa pública, onde há – por pior que seja, ao menos há – possibilidades e dispositivos legais para contestar e alterar os rumos da estatal, imagine com ela sendo privada? A água é um direito de todos e de todas, um serviço essencial que não pode estar nas mãos do setor privado.

Rafael Daguerre

Fotógrafo, Repórter, Editor e Documentarista

Um dos fundadores da Mídia1508. "Ficar de joelhos não é racional. É renunciar a ser livre. Mesmo os escravos por vocação devem ser obrigados a ser livres, quando as algemas forem quebradas" ― Carlos Marighella.

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