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Artista baiano é assassinado por defensor de Bolsonaro

Foto: Arquivo pessoal

Um artista ligado às tradições afro-baianas foi assassinado com 12 facadas na noite em que se encerrou o primeiro turno das eleições no Brasil, em 7 de outubro de 2018. Romualdo Rosário da Costa, de 63 anos, o Mestre Moa do Katendê, e o irmão foram esfaqueados após discussão sobre política, em um bar no Dique Pequeno, bairro em que residia em Salvador. Segundo os relatos, um morador novo do bairro, defensor do candidato a presidente Jair Bolsonaro, não teria gostado da posição contrária do mestre. O homem foi em casa e buscou uma faca.

Katendê foi agredido e seu irmão que o acudiu, mas não sobreviveu. O irmão, Germinio do Amor Divino, 51 anos, recebeu uma facada no braço direito e foi socorrido para o Hospital Geral do Estado (HGE), onde permanece internado e sedado. Testemunhas identificaram o autor das facadas como Paulo Sergio Ferreira, que está preso. Segundo o irmão das vítimas, Reginaldo Rosário, 68 anos, Moa estava bebendo com ele e Germinio, no Bar do João, quando o autor da facada começou a defender ideias do candidato do e ouviu críticas do capoeirista:

“Moa ponderou que era negro e que o cara ainda era muito jovem e não sabia nada da história. Moa disse ainda que ele tinha consciência do quanto o negro lutou para chegar onde chegou e o quanto poderia tirar essas conquistas se chegasse ao poder”, disse Reginaldo.

O autor do assassinato contra o mestre de capoeira e compositor, Paulo Sérgio Ferreira de Santana, 36 anos, foi preso nesta segunda-feira (08) e alegou uma discussão política como motivação do crime.

Paulo Sérgio Ferreira de Santana, 36 anos, autor do assassinato / Foto: Alberto Maraux

Ainda de acordo com o irmão das vítimas, após a discussão acalorada um dos irmãos pediu que Moa ficasse calmo, no entanto, após a situação ter sido contornada, o autor da facada teria ido em casa, retornou com uma peixeira e atacou a vítima nas costas. “Foi tudo muito rápido”, disse.

Moa, que sempre foi defensor das classes menos favorecidas é mestre tradicional da Capoeira Angola da e do Afoxé (um dos fundadores do Filhos de Gandhi) e uma das melhores pessoas que já conheci“, relata o amigo Leandro Couri em seu Facebook. E continua: “A Capoeira perde um grande mestre e eu perco vários amigos. Digo ‘vários’ porque ver um capoeirista apoiar um político declaradamente racista, pra mim, é pior que cair de cara no chão após uma rasteira alta. É preciso entender a história da arte. É preciso saber que pouco mudou e que, agora, o saiu do armário e não tem vergonha de destilar o seu ódio. Por trás de interesses escusos, aí está a Casa Grande Senzala se armando novamente. Que a morte do mestre não seja em vão! Vamos fazer o berimbau dizer a que viemos. À luta! E viva ‘seu’ Moa, agora mártir da nossa batalha.

A filha do mestre de capoeira Somanair dos Santos, de 35 anos, estava muito abalada e contou que tinha falado com o pai no início do dia. Ela perdeu a mãe há um mês. “ teve defesa alguma. Meu pai era tudo, tudo pra mim”, disse.

Môa do Katendê nasceu em Salvador (BA) e é um artista ligado às tradições afro-baianas. Compositor, dançarino, capoeirista, ogã-percussionista, artesão e educador, descobriu suas raízes aos oito anos de idade no “ILÊ AXÉ OMIN BAIN”, terreiro de sua tia e incentivadora. Em 1977, consagrou-se campeão do Festival da Canção Ilê Aiyê, o primeiro bloco afro do Brasil, e em Maio de 1978 fundou o “Afoxé “Badauê”, que desfilou pela primeira vez no ano seguinte e tornou-se campeão do carnaval na categoria de afoxé. Em 1995 com a união de colegas e admiradores da afro-brasileira, surge o grupo de afoxé “Amigos de Katendê”. Foi membro da Associação Brasileira de Capoeira Angola, discípulo de mestre Bobó de Pastinha.

Romualdo Rosário da Costa, de 63 anos, o Mestre Moa do Katendê / Foto: Arquivo pessoal

Rafael Daguerre

Fotógrafo, Repórter, Editor e Documentarista

Um dos fundadores da Mídia1508. "Ficar de joelhos não é racional. É renunciar a ser livre. Mesmo os escravos por vocação devem ser obrigados a ser livres, quando as algemas forem quebradas" ― Carlos Marighella.

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